domingo, 5 de abril de 2020

Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor




A liturgia deste domingo é especial por duas razões: em primeiro lugar, encerramos os quarenta dias da Quaresma com a celebração do Domingo de Ramos, na qual recordamos a entrada de Jesus em Jerusalém e a sua Paixão próxima; mas, além disso, temos agora uma situação inédita na história recente da Igreja, por conta da pandemia do novo coronavírus. Se em anos anteriores os católicos passávamos este tempo em filas de confessionários, vigílias e ensaios litúrgicos para a grande solenidade da Páscoa, hoje estamos recolhidos em nossas casas, impossibilitados de professar publicamente a fé que herdamos de nossos pais.

Para enfrentar tal situação, precisamos refletir diligentemente sobre o santo mistério da Paixão de Cristo, que a Igreja anuncia este ano segundo o relato de São Mateus (cf. Mt 27, 11-54) e da qual obtemos luzes e consolo diante da tribulação presente.

O sacrifício de Jesus no Calvário não diz respeito apenas a uma época do passado, mas toca toda a história humana, convertendo-a em história da salvação. Aquilo que, aos olhos dos incrédulos, poderia ter sido somente um crime horroroso, foi, na verdade, a síntese e a satisfação por todos os pecados da humanidade, desde a desobediência de Adão e Eva, o crime de Caim e a luxúria de Davi às maquinações de Anás e Caifás, à violência dos soldados, à traição de Judas e à apostasia dos cristãos de ontem e de hoje.

Sem dúvida, as cenas da crucificação podem nos causar horror. Todavia, se tivermos o olhar do centurião romano, saberemos reconhecer o Filho de Deus por debaixo de tantas chagas. É precisamente com esse olhar, pois, que devemos encarar o momento atual, fugindo das discussões secundárias que só nos levam a rixas e agitações. Temos hoje a oportunidade única de pedir a Cristo uma fé viva para transformarmos a nossa miséria em salvação. Porque a Providência Divina, neste kairós, realmente deseja nos agraciar com a luz fulgurante da Cruz de Cristo.

Essa luz, segundo Santo Tomás de Aquino, é a luz do infinito amor com que Jesus nos amou durante a sua Paixão. De fato, Ele realizou uma obra infinitamente maior que qualquer falta ou pecado jamais cometido pelo homem. Sendo Ele Deus encarnado, a segunda Pessoa da Trindade Beatíssima, todas as suas ações aqui na terra se revestiram também de uma dignidade incalculável. Desse modo, Jesus pôde oferecer a Deus Pai um amor justo, fazendo justiça à dignidade divina, ao mesmo tempo que nos dispensou um amor misericordioso, a fim de reparar as nossas misérias. Ele se converteu em novo Adão para corrigir o desatino do primeiro.

Unidos à Cruz de Cristo, nós participamos desse mesmo amor infinito, oferecendo os nossos pequenos sofrimentos para a salvação das almas. E podemos fazer isso porque Ele mesmo nos associou pessoalmente à sua Paixão, oferecendo-se de um modo particular por cada um de nós. Jesus recebeu em sua alma humana a plenitude da graça para, além do sofrimento físico e psíquico, sofrer vicariamente por cada homem e mulher de todos os séculos e lugares. Dessa maneira, Ele pôde experimentar a sensação dos pecadores que se voltaram contra Deus e, por isso, sentem-se abandonados pelo Senhor. Por eles, Jesus exclamou na cruz: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”

Naturalmente, muitos estão se sentindo abandonados neste período de isolamento social. Mas Jesus nos dá a graça de viver essa cruz com serenidade, entregando nas mãos de Deus o nosso espírito, como Ele fez no alto do madeiro santo. Por isso, associemo-nos ao Sagrado Coração de Jesus, a fim de que neste domingo nós sejamos os ramos que exaltam a entrada do Senhor em Jerusalém, cantando e glorificando: “Hosana ao Filho de Davi”.

Fonte: Padre Paulo Ricardo

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