Com alegria celebramos hoje a memória de São Bruno, fundador da Ordem dos cartuxos. São Bruno nasceu em Colônia, na Alemanha, e viveu durante a Idade Média. Estamos no séc. XI. Bruno foi inicialmente um sacerdote santo, até que, aos 40 anos de idade, resolveu deixar tudo para tornar-se monge. Mas dizer que ele viveu uma vida monástica é dizer pouco; na verdade, ele fundou uma das Ordens mais rigorosas da Igreja. Iremos descrever um pouco a disciplina dos cartuxos e explicar como ela foi idealizada por São Bruno; antes disso, porém, é necessário pôr as coisas no contexto. Como dito, São Bruno nasceu em Colônia, na Alemanha, grande cidade às margens do Reno, e logo cedo foi estudar. Estudou na arquidiocese de Reims, onde se notabilizou por sua grande inteligência.
No entanto, ele não queria saber do mundo acadêmico. Bruno então voltou para Colônia, foi ordenado sacerdote e começou um trabalho de evangelização dos pobres nos lugares mais afastados. Mas, como Jesus mesmo disse, ninguém consegue esconder uma cidade em cima da montanha (cf. Mt 5,14). Rapidamente, Bruno começou a brilhar por sua santidade, a ponto de o arcebispo de Reims pedir-lhe que voltasse à cidade. Assim foi. Bruno voltou para o lugar onde tinha estudado e, sendo ainda um simples padre diocesano, começou a reunir em torno de si um bom número de discípulos, alguns dos quais se tornariam figuras célebres na história da Igreja: São Hugo, bispo de Grenoble, e Urbano II, o papa que convocou as Cruzadas.
Embora tivesse realizado já grandes obras, Bruno estava inquieto. Assim, aos 40 anos, foi procurar um mosteiro em que pudesse viver uma vida de união com Deus. Dirigiu-se a Molesme, onde encontrou São Roberto, e quis começar ali sua vocação monástica; contudo, viu que o seu lugar era outro, então partiu em peregrinação, até encontrar um antigo discípulo, São Hugo, bispo de Grenoble. A meio do caminho, Bruno teve um sonho: três anjos lhe falavam de uma nova Ordem a ser fundada por ele. Na mesma noite, os três anjos apareceram a São Hugo, em Grenoble, dizendo-lhe: “Aqui será fundada uma nova Ordem”. Fundou-se então o primeiro mosteiro: La Chartreuse, donde a Ordem recebeu o nome por que é mais conhecida — Cartuxa.
Pois bem, como é a vida dos cartuxos e no que ela difere da de outros mosteiros? Quando se ouve falar de monge, a primeira ideia que nos vem à mente, em geral, é a de uma comunidade de homens ou mulheres que vivem juntos para rezar. É o caso, por exemplo, de uma abadia beneditina, onde se vive em silêncio, mas com muitas atividades comunitárias. Bruno inspirou-se nos Padres do Deserto, aqueles primeiros monges do cristianismo, de vida eremítica ou semi-eremítica, cada um recluso em sua cela (isto é, uma pequena cabana, chamada cælia em latim). Na Cartuxa, São Bruno quis imitar o mesmo esquema: cada um teria a própria cela; as reuniões seriam poucas e em momentos específicos. Trata-se, em resumo, de uma vida ao mesmo tempo semi-comunitária e semi-eremítica, caracterizada pelo rigor da disciplina (longas vigílias, jejuns, penitências e, sobretudo, muito espírito de oração).
Ora, quando ouvimos falar de monges como estes, homens entregues a Deus, fechados em seus mosteiros, distantes de todo o mundo, unidos para viver sozinhos, o que tendemos a pensar? “Nossa, que radicalismo! Para que se trancafiar num convento?” De fato, muitos não entendem o que leva um homem como São Bruno, um padre tão santo, que fazia o bem aos pobres, pregava o Evangelho, convertia as almas etc., a se fechar num mosteiro. Não é radicalismo; é um grande amor. O que faz de alguém um monge é o amor. Afinal, como diz Santa Teresinha, os que se amam precisam de solidão — A des amants, il faut la solitude. Na lua de mel, a esposa não quer o pai, a mãe, os irmãos, amigos e colegas por perto; quer estar sozinha com o marido. A solidão monástica é isso, um coração a coração o tempo todo. Não é, por assim dizer, uma solidão solitária; é uma solidão acompanhada — acompanhada por Deus.
Além disso, o católico nunca deve esquecer que pertencer à Igreja é ser membro de um Corpo, ou seja, é estar unido organicamente a todas as outras partes dele. Nenhum católico está sozinho. Os monges que vivem “trancafiados” em suas celas estão, na verdade, fazendo muito mais do que nós, tão agitados e distraídos, para a conversão dos povos. A oração deles é como o ar que respira a Igreja, o incenso que de dia e de noite se eleva ao céu para impetrar graças incalculáveis, uma fonte de méritos sobrenaturais que circulam pelo Corpo místico qual sangue vivo e vivificante. Sim, é poderosíssima a oração do monge.
No Evangelho de hoje, Nosso Senhor ensina o Pai-nosso. Ora, por que Jesus nos ensinou a rezar? Porque rezar é estar com Deus num encontro de amor e, ao mesmo tempo, num trabalho ativo pela salvação das almas. Pela oração, pela nossa entrega, pela nossa confiança em Deus, salvamos muito mais almas do que pelas nossas agitações, essas, sim, verdadeiramente solitárias, porque frequentemente distantes de Deus. No fundo, estamos sozinhos quando tentamos salvar o mundo com nossas próprias forças; mas, se rezamos, não há mais solidão, porque passamos a agir com o único que pode transformar os corações. — Que São Bruno nos sirva de farol e exemplo da eficácia da oração, instrumento que opera maravilhas nos membros da Igreja. Porque os cartuxos rezam e se entregam, por isso estamos aqui, recebendo os frutos de sua santa e bem acompanhada “solidão”.
Fonte: Padre Paulo Ricardo
Nenhum comentário:
Postar um comentário