Entre os índios que habitavam a região de Guanaguanare, havia um grupo conhecido como "Coromotos". Quando chegaram os colonizadores espanhóis, os Coromotos se embrenharam na selva, montanhas e vales situados a noroeste da cidade de Guanare, nas fontes e margens dos rios Tucupido e Anos.
Os Coromotos moraram muito tempo nesses lugares distantes e sua memória foi sendo perdida, até que chegou o momento de sua conversão, graças a poderosa mediação da Santíssima Virgem.
Um espanhol honrado e bom cristão, chamado Juan Sánchez, possuía as férteis terras de Soropo, situadas a quatro ou cinco léguas de Ganare. A ele se uniram para trabalhar a terra e tratar do gado dois colonizadores: Juan Sibrián e Bartolomé ánchez.
Descansando de uma longa viagem em certo dia, do ano de 1651, o Cacique dos Coromotos, acompanhado de sua mulher e filhos, eis que lhes aparece uma formosíssima Senhora de incomparável beleza, que trazia em seus braços um preciosíssimo Menino, caminhando sobre as cristalinas águas da corrente. Maravilhados, contemplam a majestosa Dama; esta lhes sorri amorosamente e fala ao Cacique em sua própria língua, dizendo-lhe que ali fora procurar água para colocar sobre a cabeça e assim poder subir aos céus.
Estas palavras foram ditas com tal unção e força que comoveram o coração do Cacique. Ele se dispôs a cumprir os desejos de tão encantadora Senhora...
No mês de novembro do citado ano, Juan Sánchez passava perto daquela região seguindo a estrada denominada "Cauro", quando ia em viagem para El Tocuyo. A certa altura, encontra o chefe dos Coromotos, que lhe conta que uma belíssima Mulher, com uma criancinha formosa havia-lhe aparecido pedindo-lhe que fosse ao local onde moravam os brancos para buscar água para molhar sua cabeça, antes de ir para o céu. E acrescentou o Cacique que tanto ele como todos os de sua tribo estavam dispostos a atender os desejos de tão excelsa senhora. Juan Sánchez, gratamente surpreendido pelo relato do índio, disse-lhe que estava indo de viagem para um povoado chamado El Tocuyo. A oito dias estaria de volta. Quando retornou, Juan Sánchez juntou-se aos Coromotos. Toda tribo partiu com o espanhol.
Seguindo as indicações de Juan Sánchez, a caravana se deteve no ângulo formado pela confluência dos rios Tucupido e Guanaguanare, num lugar que foi chamado de Coromoto. Juan Sánchez foi imediatamente à vila do Espírito Santo de Guanaguanare e avisou as autoridades sobre o ocorrido.
Os alcaides Dom Baltazar Rivero De Losada e Dom Salvador Serrada Centeno, que governavam a Vila, dispuseram que os índios permanecessem em Coromoto e ofereceram-lhes Juan Sánchez para demarcar terras para seus trabalhos e para doutriná-los nos rudimentos da religião cristã. O abnegado espanhol cumpriu sua missão cuidadosamente, fazendo de tudo para tornar feliz a permanência dos índios naquela região.
Os indígenas construíram seus ranchos, receberam as terras e, contentes, ouviam as explicações doutrinárias que lhes dava o espanhol, ajudado por sua esposa e os outros dois companheiros. Este trabalho apostólico foi sendo coroado de êxito. Pouco a pouco os índios iam sendo batizados.
O Cacique, a princípio, assistia com gosto às instruções, mas começou a se desgostar e a sentir falta de seus bosques. Não mais freqüentou as reuniões promovidas por Juan, não quis mais aprender a doutrina cristã e se recusou a ser batizado.
No dia 8 de setembro de 1652, Juan Sánchez convidou os índios que trabalhavam em Soropo para assistirem a alguns atos religiosos que haviam sido preparados. O Cacique Coromoto recusou este convite. Ainda assim, seus companheiros honraram com humildes preces a Virgem. Isso deixou o Cacique enraivecido que fugiu para Coromoto.
A cabana do Cacique era a maior entre todas as choças indígenas, mas era pequena e pobre em comparação às casas dos espanhóis. Naquela noite se encontravam na cabana uma irmã do Cacique, chamada Isabel e seu filho, de doze anos e outras duas índias. O Cacique Coromoto chegou muito triste e calado. Imediatamente deitou-se na esteira.
Vendo o seu estado, ninguém lhe dirigiu a palavra. Passou-se um longo tempo de silêncio. O Cacique tentava dormir, mas dentro de sua memória não saía aquela Senhora. Ouvia sua doce, contudo, outros pensamentos turvavam seu triste e melancólico caráter: seu orgulho humilhado pela obediência e sua desenfreada liberdade, clamava por uma completa emancipação; certa raiva interna e inexplicável lhe pintava o batismo e a vida dos branco como insuportáveis.
Em poucos minutos, a Virgem Santíssima apareceu na cabana do Cacique, em meio a invisíveis legiões de anjos que formavam seu cortejo. Dela saíam raios de luz que inundaram a choça.
Segundo o testemunho da índia Isabel a luz era tão potente que parecia a luz do sol ao meio-dia. Mas não cansava a visão daqueles que a contemplavam tão grande maravilha.
O Cacique reconheceu a mesma bela mulher que, meses antes, contemplara sobre as águas. O índio pensava, provavelmente, que a Senhora viera reprovar seu comportamento. Passados alguns segundos, o Cacique rompeu o silêncio e dirigindo-se à Senhora disse enfurecido: Até quando irás me perseguir?" Estas palavras impensadas e desrespeitosas mortificaram a esposa do Cacique, que o consolou: "Não fales assim com a bela mulher. Não tenhas tanto mal em teu coração". O Cacique, encolerizou-se e não pôde mais suportar a presença da Divina Senhora que permanecia à porta dirigindo-lhe um olhar tão terno e carinhoso, capaz de comover o coração mais duro. Desesperado, o Cacique saca de um arco com uma flecha e chegando ao auge de sua loucura ameaça matá-la. Nesse instante, a Excelsa Senhora entra na choça, sorridente e serena, aproxima-se dele que lança o arco contra o chão. O Cacique tenta abraçar a Senhora que desaparece, deixando a cabana iluminada apenas pela luz do fogão.
Fora de si e mudo de terror, ele ficou alguns minutos imóvel, com os braços estendidos e entrelaçados, na mesma posição em que estavam quando tentara agarrar a Virgem. Ele tinha uma mão aberta e a outra fechada, que apertava o máximo. Ele sentia que a bela mulher a havia fechado.
Cheio de temor, o índio disse à sua mulher: "Aqui a tenho!". As mulheres disseram em coro: "Mostre-nos". O Cacique abriu a sua mão e os quatro indígenas reconheceram ser aquela uma imagem e acreditaram que era a "Bela Mulher". Quando o índio abriu a mão, a pequena imagem lançou raios luminosos que causaram grande esplendor. O Cacique começou a suar frio. Com a mesma fúria de antes, envolve a milagrosa imagem em uma folha e a esconde no teto de palha de sua casa dizendo: "Aí tu te queimarás, para que me deixes".
O indiozinho, que interiormente desaprovava a torpe conduta do tio, prestou bem atenção no esconderijo da imagem e resolveu avisar Juan Sánchez sobre o que ocorrera. Escapou da casa por volta da meia-noite em direção a Soropo, enfrentando com coragem todos os riscos. Ao chegar, todos dormiam. Ele sentou-se à beira da porta e esperou o amanhecer.
A esposa de Juan Sánchez, ao abrir a porta de sua casa na madrugada do domingo, surpreendeu-se ao ver o menino. Ele contou-lhe tudo que havia acontecido. A mulher chamou o marido. Juan sorriu e não deu crédito ao relato do indiozinho, que repetiu sua história veementemente: "Podem ir a Coromoto agora mesmo e vocês irão comprovar o que digo".
Bartolomé Sánchez, Juan Sibrián, Juan Sánchez e o indiozinho se puseram sem demora a caminho de Coromoto. Quando chegaram perto do povoado os três espanhóis se esconderam a três quadras da casa. O menino se encarregou de ir à choça do tio apanhar a imagem. Felizmente, o Cacique e as duas mulheres estavam fora da casa. Sem que ninguém o visse, o menino entrou na casa. Com o coração em júbilo pegou a imagem e a levou para Juan que, ao recebê-la, sentiu profunda emoção. Na imagem reconhecera a efígie de Maria Santíssima, a Mãe de Deus. Com muito respeito a colocou em um relicário de prata que costumava carregar.
Retornando à sua casa em Soropo, Juan Sánchez colocou a pequena imagem, que já começava a ser chamada de Nossa Senhora de Coromoto, em um altarzinho, alumiando-a com uma vela de cera escura. Esta humilde luminária ardeu dia e noite, sem consumir-se desde as doze horas da noite de domingo até à tarde de terça-feira. Este fato foi declarado milagroso, pois o pedaço de vela deveria arder, no máximo, uma meia hora.
Terça-feira, à tarde, Juan Sánchez foi à Vila de Guanaguanare (Guanare) onde revelou ao Padre Dom Diego Lozano, tudo quanto sabia sobre a imagem. Mas este não lhe deu crédito, dizendo que aquela estampa deveria ser obra de algum viajante. Juan Sánchez, sem se lastimar por isso, regressou feliz a Soropo, pois comprara o necessário para manter uma lamparina acesa diante da imagem, que ficou em sua casa até primeiro de fevereiro de 164, isto é, um ano e quatro meses.
No dia 9 de setembro, domingo, o Cacique resolveu ir aos montes com alguns índios. Mal entrou no bosque foi mordido por uma cobra. Vendo-se mortalmente ferido e reconhecendo no acontecimento um castigo do céu pela sua péssima conduta com relação à Senhora, começou a se arrepender, pedindo em altos gritos que lhe administrassem o Batismo.
A casa de Juan Sánchez se transformou num pequeno santuário. Para aí acorreu toda a população de Guanare atraída pelos milagres, graças e favores que eram alcançados por intercessão de Nossa Senhora de Coromoto.
No dia primero de fevereiro de 1654 a imagem foi trasladada solenemente para a igreja de Guanare por ordem do pároco Diego de Lozano. A devoção popular foi crescendo espantosamente até a coroação pontifícia em 1952.
A força histórica do fato coromotano repousa principalmente no testemunho do povo. Uma tradição jamais interrompida. Na década dos anos 20, houve um evidente ressurgir do movimento coromotano, mas não se pode dizer que tenha sido o ressurgir de algo morto, pois desde sua aparição até os nossos dias, o povo da Venezuela jamais deixou de peregrinar a Guanare para honrar sua padroeira.
Atualmente pode-se afirmar que não existe um só templo católico venezuelano que não possua uma imagem de Nossa Senhora de Coromoto, sempre amada e homenageada pelos fiéis.
Fonte: ACI Digital
Nenhum comentário:
Postar um comentário