quarta-feira, 25 de março de 2020

Solenidade da Anunciação do Senhor


Assim como há predestinação para os homens, há predestinação também para os dias: os homens predestina-os Deus para a glória; os dias, predestina-os para ser glorificado neles. Hoje, dão-se juntas numa mesma data ambas as predestinações. Neste dia, predestina Deus os homens para a glória, porque este mesmo dia o predestinou para a sua glorificação. Neste mesmo dia, com efeito, quis a divina Providência coincidissem dois mistérios que, espaçados um do outro por 33 anos, não são mais do que o início e a consumação de um só, como se foram os extremos de uma circunferência, que termina no mesmo ponto de que parte. Tudo isto é o que dizem os Santos Padres de duas solenidades à primeira vista tão encontradas: a que hoje celebramos e a que hemos de celebrar em breve, na Sexta-feira Santa. Mas o que tem que ver a Anunciação do Senhor, em que festejamos o início de sua vida na carne, com o dia tristíssimo em que choramos sua Morte na Cruz? É que ambos os mistérios, como se foram a mesma porta pela qual o Filho do Homem entrou e saiu do mundo, quis Deus celebrá-lo no mesmo dia: 25 de março. É o que dizem comumente os Santos Padres, e é o que pode intuir a razão iluminada pela fé, ao compreender a perfeitíssima conveniência de coincidirem a Encarnação e a Morte de Cristo no mesmo dia em que a Terra Santa entra na primavera. Deus, encarnado no ventre de Maria, quis entrar no mundo como a primeira flor da estação, e quis dele sair, pregado no madeiro da cruz, para ver despontar na mesma hora os primeiros botões da nossa salvação. No mesmo dia em que Maria, dando o seu sim, trouxe a nós o Redentor, Cristo, entregando ao Pai o seu espírito, trouxe a nós os frutos da redenção. Maria, fazendo-se escrava dos planos de Deus: “Eis aqui a escrava do Senhor. Faça-se em mim segundo a sua palavra” (Lc 1, 38), permitiu que nela se plasmasse o mesmo corpo de que se quis vestir o Filho de Deus para cumprir o mandato do Pai: “Fostes vós que plasmastes as entranhas de meu corpo” (Sl 138, 13), “eis que eu venho […] fazer vossa vontade, meu Deus” (Sl 39, 8). Com não menor providência, pois, intercala a Igreja o tempo da Quaresma com a solenidade da Anunciação. Pondo-nos os olhos hoje no primeiro instante da vida de Cristo, leva-nos a Liturgia a contemplar o instante em que Ele a entregou por nós, para que assim nos recordemos que o da Encarnação, se teve por motivo principal a redenção do gênero humano, forma com o da Paixão um único e mesmo mistério de amor. No seio da Virgem, começou o Senhor a obrar a nossa salvação, e teria bastado uma lágrima sua, um único gemido de fome e frio, para redimir todos os pecados dos homens. Para que víssemos porém o amor de Deus por nós, quis Ele ser levado ao extremo da dor e da injustiça, suportando até o fim todo o peso de nossas culpas: “Como amasse os seus que estavam no mundo, até o fim os amou” (Jo 13, 1). — Que a Virgem Santíssima, que concebeu na primavera da graça a flor bendita de Cristo, nos alcance a graça de termos alinhado o nosso coração com a vontade de Deus, assim como se alinharam os astros neste 25 de março, dia em que Deus, glorificando-se na carne que tomou no ventre e entregou na Cruz, predestinou-nos para a sua glória no Céu.

Fonte: Padre Paulo Ricardo

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